Parteiras reinvidicam maior reconhecimento na profissãoEm passeata pela Esplanada dos Ministérios, parteiras práticas e graduadas se reuniram, no dia mundial de sua categoria, a fim de reivindicar maior reconhecimento para a profissão no Brasil.
Janaína Moreno de Carvalho nasceu em casa. A mãe, Flávia Ilíada Oliveira, 30 anos, teve ajuda de uma parteira e de uma doula para dar à luz a filha. Tudo correu tranquilo, sem sustos no meio do caminho. A menina chegou saudável ao mundo e o pai foi o primeiro a pegá-la no colo. A história da mãe e da criança, no entanto, não é antiga, como se pode imaginar em uma época em que grande parte dos bebês nasce em quartos de hospitais. Ocorreu há apenas oito meses. Janaína também não nasceu em um lugar sem acesso a unidades e centros de saúde. Foi concebida na capital federal. Flávia é publicitária e faz parte de um grupo de mães que escolheram ter um parto normal, humanizado.
“Foi uma experiência transformadora e de respeito à mulher”, relatou. “Quando damos à luz em casa, com uma parteira, há um respeito ao tempo da mãe e da criança. Meu marido participou diretamente, então, os laços familiares ficaram fortalecidos. Ele pegou minha filha no colo quando ela nasceu. Antigamente, era assim que funcionava. A mulher se recolhia. Agora, são muitos médicos, muita luz. Em um hospital universitário, às vezes, vários estudantes de medicina assistem ao parto, quando ele deveria ser mais íntimo. Também é uma forma de resgatar uma tradição.”
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que apenas 15% dos partos realizados sejam cesarianas. Embora o número de procedimentos humanizados feitos no Distrito Federal e no Brasil supere o das cirurgias, o país ainda está longe de alcançar a marca. Brasília, por exemplo, registrou, em 2010, um total de 40.543 partos em hospitais públicos. Desses, 25.238, pouco mais de 62%, ocorreram sem uso do bisturi. Nacionalmente, dos 1,96 milhão de partos feitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), 1,24 milhão foram humanizados — aproximadamente 63% do total. Os números são da Secretaria de Saúde e do Ministério da Saúde, respectivamente.
Ontem, no Dia Mundial da Parteira, profissionais práticas (tradicionais) e graduadas fizeram uma passeata que seguiu do Ministério da Saúde para o Palácio do Planalto. A Marcha Regional das Parteiras, que reuniu profissionais do DF e do Entorno, durou cerca de duas horas e contou com representantes de São Paulo, do Amapá e de Tocantins. A categoria reivindicou maior reconhecimento do governo para os dois ramos da profissão. As graduadas pedem mais apoio governamental e as tradicionais querem ser reconhecidas como agentes de saúde. Na próxima semana, elas vão entregar uma carta com as reivindicações nos gabinetes dos deputados federais.
Para Paloma Terra, parteira graduada e organizadora da Marcha Regional das Parteiras, esses números estão abaixo das expectativas, principalmente pela “falta de atenção do governo com a categoria”. Ela alega que os quase 40% de cesarianas que ocorrem no DF e no Brasil ainda representam um número muito alto. “Na rede particular, a quantidade de procedimentos cirúrgicos de parto sobe para 80%. O Hospital Brasília, o melhor do DF, tem 90%. É urgente a integração das parteiras na atenção à saúde maternoinfantil no Brasil. Somos campeões mundiais de cesarianas. A cirurgia acarreta cinco vezes mais riscos para a mãe e para a criança”, alertou.
Humanização
Na visão de Paloma, o sistema está desumanizado. Ela alega que cerca de 17% das mulheres que dão à luz no setor privado e pelo menos 27% das que entram em trabalho de parto no setor público sofrem algum tipo de maus-tratos. “As mulheres saem do parto traumatizadas. Países como a Holanda e Escandinávia, com maior índice de saúde maternoinfantil do mundo, reconhecem essas profissionais. A parteira atende em caso de baixo risco”, exemplificou. Para a professora da Universidade de Brasília e parteira Silvéria Santos, a manifestação serve para dar visibilidade à categoria. “O sistema de saúde brasileiro omite a parteira tradicional. Não registram esses partos. Ela é uma mulher que atende a mãe e respeita a cultura, os valores eos hábitos da mulher”, afirmou.
Moradora de Santo Antônio do Descoberto (GO), Sebastiana Mendes, 84 anos, realiza partos desde 1960. Ela conta que nunca perdeu uma mãe ou filho durante um parto humanizado. “Me considero importante. Nos valorizar é o caminho certo. É uma profissão muito séria e o governo deveria nos respeitar e agir”, opinou. Embora não tenha filhos, a estudante Alaya Dullius, 26, identificou-se com a causa. “Acho que temos que melhorar o atendimento obstétrico no Brasil. Ele é violento e desrespeita as recomendações da OMS fazendo cesarianas desnecessárias. Se a gente melhora a forma de nascer, cria um mundo mais humano.”
Apoio psicológico
No parto normal ou humanizado, a doula é uma mulher que geralmente acompanha a parteira.
Ela ajuda em todos os procedimentos, mas tem o papel fundamental de prestar apoio físico e emocional à mãe, além de prestar informações sobre a gravidez.
A presença da doula possibilita um parto mais seguro, mais rápido e menos doloroso.